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Projeto de fotografia exibe realidade das favelas cariocas

Os jovens Márcio Santana (trombone), Israel (saxofone), Misael (trompete), Gilson (trombone) e Matheus Silva (saxofone). No Morro do Borel. Foto: Anderson Valentim
Os jovens Márcio Santana (trombone), Israel (saxofone), Misael (trompete), Gilson (trombone) e Matheus Silva (saxofone). No Morro do Borel. Foto: Anderson Valentim

O Favelagrafia conquistou o Rio de Janeiro e diversas cidades brasileiras através da fotografia. Cerca de nove fotógrafos registram o cotidiano de suas comunidades utilizando apenas um iPhone e muito talento. Tem como foco eternizar as histórias de moradores que vivem nas favelas cariocas, realçar sua beleza e exibir o lado positivo e distante daquele que a mídia tradicional divulga. Os integrantes são moradores do Morro do Borel, Santa Marta, Morro da Mineira, Complexo do Alemão, Providência, Cantagalo, Babilônia, Rocinha e Morro dos Prazeres.

O projeto repercutiu e adquiriu mais visibilidade após uma publicação nas redes sociais. A foto com jovens segurando seus instrumentos musicais representando uma arma, gerou muitos elogios e divulgações dos internautas e alguns artistas, como Isis Valverde, Jorge Aragão, Caio Blat, entre outros. Anderson Valentim é o fotógrafo que registrou e compartilhou a importância da arte nas favelas. Os jovens Márcio Santana, Israel, Misael, Gilson e Matheus Silva procuraram um futuro melhor através da música, longe do caminho das drogas ilícitas e da criminalidade. Todos os membros são amigos de Valentim, e tocam na mesma banda, a ‘Slim Afrikan’.

Anderson conta que se surpreendeu com tamanha repercussão e que sua intenção era apenas passar uma mensagem de amor e paz nas comunidades, e acabar com os rótulos de que na favela existe somente a violência. O carioca de 34 anos, relembra bons momentos de sua infância ao andar por becos e vielas fotografando o dia a dia no Morro: “Eu sempre amei o Borel, amo o Morro. Apesar dele ser famoso pela violência, aqui você pode chegar a qualquer hora que não terá nenhum problema. Ele tem uma história linda, as pessoas são boas com as outras. E tem uma galera excepcional aqui, de artistas trazendo os traços no sangue, do universo da arte, não só do samba, mas de tudo. O Morro é espetacular.” O fotógrafo afirma que o atual objetivo do projeto é crescer cada vez mais e alcançar outras comunidades do Rio de Janeiro.

Entre os dias 05 de novembro e 04 de dezembro, o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM) recebe a exposição “Favelagrafia”, resultado do projeto de mesmo nome, criado pela NBS Rio+Rio com o objetivo de trazer um novo olhar sobre as favelas, através de seus moradores. Cada fotógrafo terá em torno de 20 imagens selecionadas, dispostas em vielas fotográficas, que compõem a exposição no MAM.

As obras foram escolhidas pelos próprios fotógrafos junto ao curador da mostra, André Havt, Diretor de Arte da NBS e um dos idealizadores do projeto, respeitando o conjunto da linguagem e a linha de trabalho de cada fotógrafo. “O mais interessante durante este processo é ter a certeza que estes nove fotógrafos são artistas em potencial que estão se credenciando para serem olhados pelo mundo. Tem sido fantástico poder acompanhar e contribuir para a evolução do olhar deles. Como também tem sido igualmente fantástico aprender a desconstruir meu olhar com cada um deles”, diz Havt.

Para a diretora da NBS Rio+Rio, Aline Pimenta, o sucesso do projeto é fruto da dedicação e competência de cada um dos participantes. “Os nove fotógrafos selecionados para o Favelagrafia representam perfeitamente o potencial e o talento das favelas. A exposição no MAM coloca holofotes nestes talentos, desconstruindo a imagem estereotipada que a sociedade tem sobre a favela”.

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Ygor Raphael, bailarino e morador do Complexo do Alemão. Foto: Josiane Santana

O jornal Voz da Comunidade conversou com Josiane Santana dos Santos, integrante do Favelagrafia e moradora do Complexo do Alemão. A carioca conta que no ano de 2013, trabalhou para um projeto da prefeitura do Rio de Janeiro e em algumas das gestões havia vagas de cursos para a comunidade. Ela logo se interessou e se inscreveu no curso de fotografia, onde se tornou funcionária e aluna também. Santana relembra momentos de depressão e afirma que a fotografia chegou como uma cura em sua vida, desde então seguiu estudando e comprou sua câmera fotográfica. Participou do curso de fotografia do Voz da Comunidade em parceria com a UNISUAM e o CRJ Alemão, em 2015. Atualmente ela trabalha com books, e segue colaborando com alguns coletivos no Alemão e na Maré. Também exercer a profissão em intervenções artísticas e culturais, e para o ‘Favelagrafia’.

Josiane ingressou na faculdade de jornalismo por consequência do seu amor pela fotografia. Ela conta das novas conquistas adquiridas através do novo projeto: “Essa exposição no MAM é algo que nos deixou muito felizes. Na verdade, nunca imaginei isso em minha vida. Uma mulher favelada expondo suas fotos no MAM. Acredito que o Favelagrafia tem tudo pra ser exibido sim em outros países. O projeto está evoluindo bem, acho que todos os fotógrafos e inclusive eu, estamos conseguindo derrubar essas barreiras e mostrar um outro lado. Um lado riquíssimo e super positivo que essas favelas possuem e que superam todas essas coisas ruins.”

Moradora do maior conjunto de favelas cariocas, mãe e determinada, Josiane Santana tem orgulho da comunidade em que nasceu. Reconhece que sua realidade não é a mesma daqueles que nela vivem, pois reside nos acessos, na famosa “pista”. Mas afirma que ama fotografar a favela e mostrar quantas possibilidades e potencialidades ela tem. E vive a mesma dor que todos os moradores, preocupações e sonha com um futuro melhor para a comunidade.

Quando questionada sobre a mensagem que o projeto pretende transmitir aos moradores de dentro e fora das favelas do Rio de Janeiro, ela ressalta a importância de mostrar a realidade. Desconstruir as “maquiagens” em todos os fatores: “Sabemos que a vida dentro de uma comunidade não é fácil, e que não há interesse por parte do governo em mudar para melhor a vida desses moradores. A mídia também ajuda na montagem de uma imagem de que está tudo “perfeitamente sob o controle” para quem está de fora. Nós vamos lá e fotografamos a verdade no interior desses becos. A falta do saneamento básico, da acessibilidade, mobilidade e moradias precárias. Mas também mostramos que mesmo com todos esses problemas, tem um povo que resiste, cheio de vida e de alegria. Que não abaixa a cabeça diante das dificuldades. Que dentro das favelas tem uma juventude produzindo, estudando, fazendo a diferença. Tem arte, tem cultura, tem música, tem festa. Favela vai além de tiro, violência e tristeza”, concluiu Josiane, afirmando ao jornal Voz da Comunidade que o Complexo do Alemão recebeu o projeto de uma forma positiva.

O Favelagrafia é incentivado pela Prefeitura do Rio de Janeiro, através da Secretaria Municipal de Cultura, idealizado pela NBS Rio+Rio, com realização da ISL Produções e patrocínio do Consórcio Linha 4 Sul.

A exposição será gratuita e durante este período, serão apresentados também um livro e um site documentando o projeto, trazendo o perfil dos fotógrafos e seus dados para contato. Algumas das fotografias a serem expostas também já estão disponíveis no Instagram @favelagrafia, que compartilha alguns momentos do projeto.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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