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Um ano após perda da filha Ágatha Félix, Vanessa relata como tem sido o recomeço

365 dias sem Ágatha e sem justiça. A pequena moradora foi morta por policiais da Unidade de Polícia Pacificadora.

Um ano após morte da filha, Vanessa Sales Félix, de 33 anos, conta como dia após dia permanece na luta para seguir em frente com a vida e ao mesmo tempo exigir justiça em memória da filha Ágatha Felix. A menina foi mais uma vitima da política genocida que cerca as favelas do Rio de Janeiro e vem se intensificando nos últimos anos.

No dia 20 de setembro de 2019, por volta das 21:30 de uma sexta-feira, a pequena Ágatha Vitória Sales Félix, de 8 anos, foi morta após ser baleada nas costas dentro de uma kombi, por um disparo de fuzil feito por um PM da UPP da Fazendinha. A trágica e precoce interrupção da vida da jovem bailarina de 8 anos impactou todos os moradores do Complexo do Alemão e trouxe ainda mais o debate a respeito de como a política de segurança do Estado age dentro desses espaços, que são criminalizados.

“São 365 dias sem Ágatha. É muito tempo. Mas que passaram muito rápido sem a minha filha aqui. E eu preciso falar, preciso lembrar. Porque todas as crianças (que morreram vítimas da violência dentro das comunidades), precisam ser lembradas. Precisamos continuar gritando, pois senão vai continuar acontecendo, aí é outra mãe, e outra mãe… E a gente precisa bater na porta das autoridades e mostrar que vivem pessoas de bem aqui, e quem eles colocam na favela precisa de treinamento. Não podem entrar dessa forma”.

Foto: Matheus Guimarães/Voz das Comunidades

A continuidade de vidas interrompidas nas favelas

Ainda sobre outras crianças vítimas de violências dentro das comunidades, Vanessa Sales falou a respeito do sentimento de, infelizmente, ainda terem tantas mortes de vidas tão jovens. Nenhuma mãe imagina enterrar o sua filha(o), contudo, isso é a triste realidade que muitas mães da favela ainda vivenciam. 

“É muito doloroso que você fica sem reação né, é muito tenso. Hoje eu sei o que é a perda de um filho para uma mãe. Sei que elas passam. Se não existir uma fé, um apoio, é difícil… Difícil ver seu filho ser retirado dos teus braços. Quem realmente acaba sofrendo é o inocente, que perde o direito de ir e vir. Eu já não tenho mais esse direito. Quem sofre mesmo é quem fica. Eu tenho consciência de onde a minha filha está, lá no céu. mas Vanessa você preferia que sua filha tivesse no céu ou tivesse na Terra? Na terra, né?! Que nada disso tivesse acontecido”.

A fé importante para o recomeço

A fé foi fundamental para Vanessa Sales e sua família em todos os instantes desse recomeço. Que em Deus encontrou forças para continuar a vida e não desistir de reivindicar justiça pela sua filha. “Peço muita força a Deus, e o coloco em primeiro lugar. É ele que me passa a força. Creio ele vence todas as batalhas. Chega um momento que você para e pensa em tudo. Não é fácil ter força a todo momento né. Hoje se estou muito cansada, peço: Senhor me fortaleça!”.

Foto: Matheus Guimarães/Voz das Comunidades

Vanessa Sales conta também como foi voltar para casa e ver que a sua relação com o Alemão mudou, após todos os acontecimentos. “A princípio eu não queria. Não queria rever tudo aquilo não. Não queria ver nada disso, não queria voltar para casa (…) Eu fiquei seis meses na casa da minha mãe, que fica em outra parte do morro. Meu marido conseguiu ir para casa, e ficou naquelas idas e vindas, comigo, lá na minha mãe. Cheguei a ir para juntar algumas coisas da Ágatha. Foi muito difícil, porque parece que você tá se desfazendo mesmo que criança não esteja ali. Não tem comparação ver aquelas homenagens, foi muito importante, porque me senti abraçada. Eu realmente acredito que o amor, a educação, que eu transmitia para minha filha, ela transmitiu para outras pessoas e isso contagiou outras da comunidade.”

A luta por justiça

Esta busca por justiça foi presente durante todos estes 365 dias desde a partida de Ágatha. Vanessa ressalta a importância de que haja uma responsabilização maior quanto a atos como esse nas favelas do Rio, para que outras vidas inocentes não sejam tragicamente interrompidas pela violência.

Foto: Matheus Guimarães/Voz das Comunidades

“O que está acontecendo é isso que eles querem, então a gente precisa continuar batendo lá na porta. Algo precisa melhorar, principalmente essas táticas que estão acontecendo dentro das comunidades. Porque não disponibilizar cursos, brincadeiras, projetos para as crianças, porque não dar sequência nisso? Elas são o nosso futuro. Pessoas são futuro. Não consigo ver um mundo melhor, mas espero um mundo com mais melhorias, e menos violência, do jeito que as coisas estão, não é bom para eles, muitos menos para nós”.

Vanessa Salles atualmente se vê com um papel importante na luta por melhorias nas questões de menos violência contra a favela. E como uma figura representativa, tentar dar voz a outras tantas mães que perderam seus filhos, vítimas de uma guerra que, muitas das vezes parece não ter fim, e que cada vez mais vem deixando duras marcas em tantas comunidades do Rio.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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