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“Nunca foi sobre o lugar que vou chegar, mas o caminho que percorri para chegar” GABZ

Texto: Mariana Assis e Rick Trindade

Se a gente perguntar se você conhece Gabrielly Nunes, muito provavelmente a sua resposta será não. Mas se falarmos em GABZ, certamente você saberá de quem estamos falando. “A GABZ é a Gabrielly Nunes potencializada, são meus sentimentos. Gosto de falar que a GABZ é minha Deusinha, minha super heroína pessoal”, brinca.

A jovem, que recentemente completou 21 anos, é atriz e rapper. Há pouco tempo podíamos desfrutar do talento de Gabz na TV aberta, ela estava no elenco de “Malhação: Toda Forma de Amar”, que teve o seu fim adiantado por conta da pandemia que estamos enfrentando. Mas, engana-se quem pensa que esse foi o primeiro trabalho da jovem nas telinhas, ela já participou de outras produções como “Teca na TV”, e interpretou a versão jovem da personagem de Taís Araújo na novela “Viver a vida”, entre outros trabalhos. 

Gabz. Créditos: Reprodução Instagram

“Pele” é o trabalho musical mais recente da artista, para ela, essa música tem um significado muito especial. “Agora tô mostrando uma GABZ mais madura e autoral, eu faço parte de todos os processos do trabalho e agora to olhando mais pra dentro do que pra fora também”, conta. 

Cria da favela de Irajá, GABZ ressalta que os objetivos principais que norteiam o seu trabalho é mostrar o potencial e a cultura da sua quebrada. Ela reforça o caráter único das produções das quebradas e o talento das pessoas que vivem nesses territórios. 

Em conversa com o Voz das Comunidades, a artista bateu um papo sobre a sua experiência no Ensino Superior, como foi atuar em Malhação, e as alegrias e desafios de ser uma mulher negra, atriz e cantora no Brasil.

“Eu faço arte pra representar onde eu vim pro mundo todo, mostrar o potencial e a cultura que NÓS produzimos lá, é uma parada só nossa.” 

Pergunta: Quais ensinamentos você levou do Curso de Ciências Sociais? 

Resposta: Acho que pensamento crítico. Uma coisa importante também é saber como funciona as coisas, como devo falar pra ser levada a sério por essas pessoas. Engraçado que meu TED TALK é justamente falando da minha própria linguagem e como eu luto pra ter o direito de me expressar como quiser, mas saber todos os códigos nessa sociedade facilita.

P: De alguma maneira, o curso ajudou no processo de construção da GABZ que você é hoje?

 R: Sim, nem só pelo curso, mas pelas experiências. Se eu não tivesse vivido o que eu vivi, sofrido o que sofri, me frustrado, eu não teria a bagagem que tenho pra ser a artista/profissional que sou. E isso é uma coisa que sempre falo pra quem tá no corre, seja na faculdade ou em qualquer outro lugar e não tá se encontrando ainda, dê tempo ao tempo, tudo isso vai servir de bagagem.

P: Como foi a experiência em um ambiente acadêmico? 

R: Sinceramente, odiei. Eu tenho críticas muito severas à academia e seus métodos de ensino. A universidade que eu estudei era elitista, então, amados, muita luta. Tirando os motivos óbvios de exclusão social, a própria dinâmica é bem excludente. Eu tinha MUITA crise de ansiedade na faculdade e medo de falar em público, talvez seja rebelde demais pra isso também, só sei que quando vi que podia falar tudo que tentava falar em sala de aula através da arte, e ser ouvida, foi libertador.

P: Algum dia você chegou a imaginar que estaria onde está? 

R: Acho que não parei pra imaginar. Eu acredito muito em caminho, me prendo muito aos meus processos. Eu me envolvo com arte desde os 6 anos e com 8 já fui pra TV, nessa época não sabia o que era caminho, eu só fazia as coisas. Muitas coisas aconteceram na minha vida incluindo assédio, racismo, que me fizeram querer trabalhar nos bastidores, estudar, tentar entender o mundo que eu vivia e quem eu sou nele, daí que fui me reinventar com xarpi, roda de rap etc também decidi fazer ciências sociais pra me entender mais ainda, era considerada a nerd do meu grupo, SEMPRE gostei muito de ler e escrever e os meno até me gastavam mas sempre respeitavam, principalmente quando eu refletia sobre o que a gente já fazia.

“é complicado ter tanto potencial e ver tanta gente com TANTO potencial sem esperança de usar tudo isso”

Eu tinha muita revolta dentro de mim, eu gostava de arte pra extravasar, eu vivia entre querer me entender e a angústia de me entender nesse mundo, é complicado ter tanto potencial e ver tanta gente com TANTO potencial sem esperança de usar tudo isso, dá angústia, e nem acesso a psicologia a gente tinha então a gente extravasava, ia pra baile pra esquecer… Passei na faculdade e a sensação de ser inacabado aumentou em mim, nunca quis me encaixar, ariana né mores hahah. Tive uma fase muito destrutiva, tive um relacionamento que se tornou muito tóxico, a gente tava muito perdido, muitos sonhos e muitas frustrações, e homem é foda também (ele me agregou muito também, inclusive ele que me abriu os olhos pra passar pela transição etc) e perto dessa época conheci o candomblé (que sempre esteve ali eu só não sabia o nome exato) que me fez entender mais ainda o que eu sou e meu caminho. Assim que entrei pro candomblé eu consegui terminar e voltar pra arte, comecei a ter mais disciplina e força de vontade pra transformar tudo isso que eu vivi em conhecimento e motor pra transformação.

Falei muito né? Mas isso foi pra dizer que nunca foi sobre o lugar que eu vou chegar mas o caminho que eu percorri pra chegar, tenho minhas metas e sou MUITO AMBICIOSA mas eu sei o quanto é diferente chegar alto agora e quando eu não sabia o significado das coisas, é maior do que eu. Por mais que não saiba onde vou chegar eu tenho segurança que vai ser o meu caminho. 

“Eu acho sempre muita pressão estar em ascensão sabe! Ser uma promessa dá um medinho, mas é muito bom ver o que tá sendo construído.” 

P: Como foi a sua infância? Quais boas lembranças você tem dela? 

R: Foi bem doida por isso de ser criança artista. Eu vivia tipo a Hanna Montana da favela, dois mundos. Tenho lembranças ótimas dessa troca de mostrar pros meus amigos de infância e montar brincadeiras de teatro com eles. Lembro muito de dançar muito funk com o furacão 2000, eu aprendia com as minhas primas, gastava muito com os moleques na rua, a gente brincava, muito piadas e etc, isso tudo construiu muito o que eu sou como pessoa e como artista. Lembro desde essa época tentar levar essas coisas do meu cotidiano pro que eu fazia no teatro.

P: Como foi o processo para conseguir o personagem em Malhação? E como foi a experiência com a novela?

R: Consegui bem no processo que citei acima de quando voltei pra arte. Depois que fiz meu slam as coisas simplesmente aconteceram, ali foi meu grito mais forte e logo em seguida vieram muitas oportunidades, abri muito minha visão de mundo. Fazer novela foi incrível; me fez ver que queria realmente ser atriz e foi mágico demais ver o poder que a gente tem de mudar a vida das pessoas com nossa arte.  Falei que eu tinha muita revolta dentro de mim e isso me marcou muito enquanto aprendizado de transformar essa revolta em transformação.

P: Você é uma atriz e cantora em ascensão, como é essa sensação? Como você lida com isso? Tem preferência por alguma das profissões?

R: Eu acho sempre muita pressão estar em ascensão sabe! Ser uma promessa dá um medinho, mas é muito bom ver o que tá sendo construído. Hoje já não sei dizer qual é a minha profissão favorita. Acho que como passei 1 ano e meio só sendo atriz, eu tenho algumas metas que quero conseguir enquanto cantora, tipo meu álbum e EP. Também quero mostrar o que sou como escritora e roteirista, mas tudo em seu tempo. Me inspiro muito em Janelle Monáe e Donald Glover que conseguem fazer trabalhos INCRÍVEIS em várias áreas, não quero fazer muitos álbuns quero fazer álbuns que marquem. 

P: O que você tinha em comum com Jaqueline? O que ela ensinou pra Gabz?

R: Meu processo com a Jaqueline foi o de encontrar leveza em meio à revolta, ela amadureceu junto comigo, e ver que se conhecer e conhecer o mundo são processos mútuos. Ela parece muito comigo quando eu era bem novinha. 

“Fazer novela foi incrível; me fez ver que queria realmente ser atriz e foi mágico demais ver o poder que a gente tem de mudar a vida das pessoas com nossa arte.”

P: Durante esse período de quarentena, você informou, nas suas redes sociais,  que está passando com sua avó. Como tem sido o convívio com ela e como tem lidado com a saudade dos seus pais e irmão?

R: Minha família é a coisa mais importante pra mim, faço tudo inspirada neles e pra eles todo mundo ali deu muito duro pra eu conseguir estar aqui. Tá sendo intenso isso de pandemia me preocupa muito, faço FaceTime com eles sempre pra matar saudades, mas é bom que todo mundo se faz companhia.

P: Quais são as suas inspirações e  referências?

R:  Janelle Monáe, Donald Gloover, Zezé Motta, Rihanna, Elza Soares, Alcione minhas amigas d geração Karol Conka, MC Rebecca, MC Tha.

P: Você acabou de lançar uma música nova e um clipe também. Fala um pouco sobre esse novo trabalho? 

R: Lancei PELE uma música que significa muito pra mim musicalmente. Agora tô mostrando uma GABZ mais madura e autoral.  Eu faço parte de todos os processos do trabalho e agora to olhando mais pra dentro do que pra fora também. 

P) Com certeza tem em alguma favela ou periferia, um jovem ou uma jovem que te vê como inspiração e que sonha chegar onde você chegou. Qual conselho você daria pra esse(a) jovem? 
R: Segue teu caminho, olha pra dentro, não perca teus princípios. Não vai ser fácil, mas se você tiver eixo você vai conseguir! Estuda bastante porque nesse mundo ainda temos que ser 30x melhores, mas isso a gente tira de letra. Muita fé.

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EDITORIAS

PERFIL

Rene Silva

Fundou o jornal Voz das Comunidades no Complexo do Alemão aos 11 anos de idade, um dos maiores veículos de comunicação das favelas cariocas. Trabalhou como roteirista em “Malhação Conectados” em 2011, na novela Salve Jorge em 2012, um dos brasileiros importantes no carregamento da tocha olímpica de Londres 2012, e em 2013 foi consultor do programa Esquenta. Palestrou em Harvard em 2013, contando a experiência de usar o twitter como plataforma de comunicação entre a favela e o poder público. Recebeu o Prêmio Mundial da Juventude, na Índia. Recentemente, foi nomeado como 1 dos 100 negros mais influentes do mundo, pelo trabalho desenvolvido no Brasil, Forbes under 30 e carioca do ano 2020. Diretor e captador de recursos da ONG.

 

 

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